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A Magia do Espelho: 2011

A Magia do Espelho

Espaço para devaneios, reflexões, desabafos, dicas culturais e otras cositas más

:(:(:(:(:(:(:(:(:(:(

Na última noite, tive mais um sonho com a minha mãe. Desta vez, ela atendia aos meus pedidos e retornava, me perguntando se eu estava feliz com a sua volta. Eu, de tão feliz, não tinha palavras para expressar como me sentia bem com ela ao meu lado. Acariciava seu rosto e ria bobamente. Escutava sua voz sem acreditar que aquilo estava acontecendo novamente. Depois, passeávamos alegremente pelas ruas da cidade, como fizemos tantas vezes. Então eu acordei e voltei para o pesadelo da vida.

O tempo passa e, ao contrário do que as pessoas dizem, o sofrimento não passa, nem ameiza, só aumenta. O que acontece é que a gente aprende a construir “reservatórios” na vida, isolando do mundo todo o sofrimento que a alma traz e vestindo uma fantasia de que a vida tem e pode continuar sendo vivida dentro das formalidades que ela exige e sendo relativamente “feliz”.

Bom dia, Boa tarde. Boa noite. Como vai? Tudo bem. E as novidades? Tudo na mesma. Já ouviu esta notícia? Vamos fazer isso? Já leu este livro? É preciso fazer este trabalho. É preciso lidar com este conflito. É preciso controlar as emoções. É preciso administrar a vida, até onde é possível. É preciso aprender que não somos nada...

Dividindo o passado

O colar, com um pingente prateado em formato de rosa, adquirido na mocidade e já envelhecido, continuava guardado em uma simples caixinha de papelão, onde outros fragmentos do passado de uma vida curta também jaziam. Foi difícil tirá-lo de lá, apossar-me de algo que sempre foi tão dela, sempre foi tão ela. Agora, o colar com o qual eu gostava de brincar quando criança, sempre a contragosto de mamãe, passou a ser meu, mas de uma forma triste demais para as palavras descreverem.

Apesar de simples e de não ter valor material, o valor sentimental do colar deveria ser grande para mamãe, pelo cuidado que ela tinha com ele. No entanto, pela distração das coisas da vida, jamais lhe perguntei a história daquele colar, que hoje, após tantos anos, está comigo, como uma lembrança que guardarei enquanto eu viver.

O colar não foi a única coisa dela que veio para mim após sua precoce partida. O mesmo ocorreu a outros objetos pessoais de mamãe, coisas acumuladas ao longo da vida, a maioria guardada pelo puro apego sentimental. Ela gostava de guardar tudo. Absolutamente tudo que lhe trouxesse alguma recordação, fosse de uma pessoa, de um momento ou de uma fase da vida. Desde papéis e caixinhas de papelão repletas de outras lembranças, até relógios, brincos e artigos de decoração. A maioria sem muito valor material, mas com um valor sentimental inestimável. 

Desde muito cedo, aprendemos que não deveríamos mexer nas coisas de mamãe, algo que realmente a tirava do sério. Esse conhecimento, contudo, deixava-nos ainda mais curiosas na infância. Assim, desobedecíamos a ordem de não mexer nas coisas dela e, consequentemente, trazíamos para nós toda a responsabilidade sobre coisas quebradas, sem bom funcionamento ou mesmo desaparecidas.

Quando crescemos mais, aprendemos a respeitar melhor esses limites. Mesmo assim, até hoje (ou até o fim da vida que um dia eu tive), sempre que ia para casa, uma das coisas que eu costumava fazer era abrir as portas do guarda-roupa de mamãe, em busca de novidades. Mamãe adorava novidades. Eu também.

Abrir as portas do guarda-roupa de mamãe e olhar atentamente, sem mexer em nada, apenas checando se havia algo novo, era praticamente um ritual para mim. Agora, isso nunca mais ocorrerá. Ela não pode mais buscar as novidades desta Terra, nem eu posso mais compartilhar com ela essas pequenas “descobertas”...

Depois de sua partida, alguns motivos nos obrigaram a antecipar a partilha de uma pequena parte das coisas de mamãe, contrariando a nossa vontade de manter as coisas dela exatamente como ela as deixou. Foi difícil mexer nas coisas de mamãe, ficamos com um sentimento estranho, como se estivéssemos contrariando a sua vontade e desrespeitando-a. Mas foi preciso.

Começamos a divisão pelos "paninhos" (risos). Se tinha uma coisa que mamãe gostava era de arrumar a casa, enfeitá-la completamente. Para isso, ela tinha como adereços favoritos toalhas, panos, passarelas e afins. Muitos. Muitos mesmo. Tantos que uma boa parte nunca foi usada. Ao final da partilha, para mim, minhas duas irmãs e meu pai, cada um saiu com uma caixa de “paninhos”.

Além de comprar para ela aos montes, mamãe também adorava presentear as pessoas que ela amava, incluindo as filhas, com toalhas de banho bordadas, passarelas de mesa, conjuntos decorativos para cozinha etc. Assim, sempre brincávamos com ela sobre a história dos “paninhos” e, agora, nenhuma de nós ganhará mais nenhum paninho dela, que ela nos dava com tanto amor.

Também dividimos algumas joias e bijuterias de mamãe. O valor material não foi considerado na partilha, embora tenhamos nos esforçado para manter o equilíbrio da divisão para as três filhas. Cada uma escolheu algo que lembrava mais mamãe.

Uma das minhas irmãs, por exemplo, ficou com um colar de ouro, com um pingente de bonequinha, que minha mãe não tirava do pescoço. Dentre as peças escolhidas pela minha outra irmã, ficou o anel de formatura de mamãe, outra coisa que ela usava sempre. Já eu, além do colar com pingente de rosa, escolhi um brinco prateado e com uma pedra azul que ela me emprestou para uma quadrilha junina quando eu tinha nove anos, o anel de formatura do Curso Normal e outro anel que ela usava sempre, dentre outras coisas.

O dia da partilha magoou ainda mais a nossa ferida e intensificou a saudade de mamãe. Mas também demos boas risadas ao recordarmos alguns momentos que vivemos com ela e imaginarmos como ela estaria se divertindo aos nos ver ali, lembrando fatos engraçados dela. A lembrança da risada de mamãe é muito forte. Ela adorava sorrir.

Depois desse dia, descobrimos outros tesouros sentimentais que mamãe guardou durante toda a sua vida, o que só aumentou a nossa tristeza e saudade. Aliás, à medida que o tempo passa, a saudade e dor são cada vez maiores... Sobre estes outros tesouros, falarei em outro post.

Um pequeno desabafo



Mamãe se foi não tem dois meses, mas, pela quantidade de mudanças e sentimentos que vivi nesse período, parece que já faz um século. A saudade e a falta que ela faz são enormes, indescritíveis, pois ela nos amava incondicionalmente e vivia para nós. Frequentemente sinto seu cheiro, seja em casa ou na rua, penso sempre que ela voltará, que é apenas uma ausência longa, mas que, um dia, ela estará de volta, embora a razão em diga que não.

Além de lidar com a dor da perda de mamãe, com a tristeza e com a saudade, tenho tido que lidar com outros problemas familiares e Deus sabe como o fardo tem sido pesado. No meio dessa luta, que jamais imaginei que passaria, tenho alternado momentos mais “leves” com momentos de profunda tristeza. A minha vontade seria morrer junto com mamãe, assim evitaria tanto sofrimento, mas não foi essa a escolha de Deus, então, tenho que seguir a vida da melhor maneira que posso.

Estou me esforçando para seguir em frente, para fazer um bom trabalho e ser uma boa companhia para as pessoas (elas não gostam de gente triste!!!), mesmo que, vez por outra, lágrimas insistam em cair dos meus olhos. Se me perguntam se estou bem, para algumas pessoas (que não entenderiam o que estou passando), digo que sim, embora contrariada. Para outras, digo que não e acho que as coisas nunca vão ficar realmente bem depois de toda essa experiência triste e traumática. Afinal, vai sempre faltar uma parte de mim. Uma parte quase vital.

Estou aprendendo a fazer as coisas sem mamãe, aliás, sem a sua presença física, pois ela me acompanha dia e noite, em qualquer lugar, sempre nos meus pensamentos e orações. Estou reaprendendo a sorrir, a fazer piadas, a elaborar planos, mas, no meu íntimo, sempre esperando pelo dia do nosso reencontro.

O engraçado e estranho, ao mesmo tempo, é que, embora a morte seja uma realidade para todos nós (não importa o quão bonito, rico ou legal você seja, você também irá morrer, pois a morte vem para todo ser vivo), nós não estamos preparados para lidar com a perda de pessoas amadas. Nem quem perde, nem quem vê alguém perder. Algumas pessoas, se te veem triste pela perda, dizem que você tem que parar de chorar, porque a vida continua. Outras, se te veem sorrindo, acham que você já superou a perda. Sinceramente, acho que ninguém supera a perda, mas aprende a conviver com ela.

No meu caso, estou sempre com essa tristeza no meu coração, mas nem sempre a expresso. Nem todos os dias eu estou “feliz” (como se ser realmente feliz fosse possível agora), nem todos os dias eu quero cortar meus pulsos. Infelizmente, as pessoas ainda olham muito para a vida dos outras e deixam de se importar com a sua. Olha para a vida alheia, não para ajudar, mas simplesmente para julgar. Sei que esse é um comportamento “comum” na natureza humana, mas é difícil de lidar.

Em menos de dois meses, sofri, aprendi e constatei coisas que jamais imaginaria. Entre essas coisas, está a questão da amizade. Recebi apoio de pessoas que já estavam fora do meu cotidiano há muito tempo, de amigos de infância que eu não via há muitos anos, mas que, mesmo assim, guardavam um grande carinho por mim e pela minha família. Foi um momento para revelar também quem são as pessoas que passaram e que estão na nossa vida. Por outro lado, algumas pessoas que fazem parte do meu cotidiano me decepcionaram, não tiveram uma atitude de amigo. Em alguns casos, isso não foi uma surpresa, eu até já imaginava, mas me recusava a aceitar. O comportamento dessas pessoas só confirma para mim o egoísmo delas; o quanto elas se consideram inatingíveis por qualquer desgraça, uma vez que a sua família e a sua vida estão muito bem, obrigada; e o quanto estão apegadas às aparências.

Essas são as pessoas que não gostam de gente triste, que gostam de oba-oba, de dizer “uhu, vida loca! Olha como eu sou feliz”, valorizam mais uma roupa, uma festa ou uma companhia de diversão do que amizades verdadeiras. Para essas pessoas, além de relatar a minha decepção com elas, só tenho algo a dizer: vocês não são inatingíveis e, no dia que passarem realmente por uma barra pesada, somente os amigos verdadeiros estarão lá para ajuda-las. Não vai ter roupa bonita, status ou companhia de farra. Só a família e os verdadeiros amigos. Agora, se não cultivarem essas amizades, a situação será ainda mais difícil.

Esse foi só mais um desabafo, do que posso contar nesse momento, porque se fosse para falar tudo, abertamente, nem sei o que aconteceria. Fico por aqui, digerindo, aos poucos, minhas dores, tristezas e decepções. Elas também fazem parte da vida e eu, como qualquer outro ser humano, não estou imune a elas.

Saudades da Infância II

Ah, que saudade de ser criança, de não ter outra preocupação a não ser brincar, brincar e brincar. De ir pra escolar e esperar ansiosamente a hora do recreio para comer um gostoso lanche e me divertir com meus coleguinhas, brincando das mais variadas formas: pega-pega, pular corda, bandeirinha, amarelinha, massinha de modelar etc.

Que saudade de ir para casa depois da escolar e passar o resto do dia vendo meus programas preferidos, sem me importar com o tempo, sem pensar em problemas para resolver, sem medos ou receios, sem pressa de acabar. Apenas me deitar confortavelmente e assistir a desenhos como Pica-Pau, Caverna do Dragão, Ursinhos Carinhosos, Smurfs, Ursinhos Gummi, Turma da Pesada e muitos outros. Emendar um programa no outro, rir muito com as trapalhadas do Chapolin e do Chaves, aprender coisas novas com o Rá-Tim-Bum e com o X-Tudo, ver a representação de clássicos infantis no “Contos de Fadas”, um dos meus programas preferidos na infância.

Saudade de brincar na rua, correr sem medo de ser feliz, de chamar os coleguinhas da vizinhança e fazer uma supergincana em casa, como no programa da Xuxa, com direito a imitar a descidinha da nave e tudo o mais. Saudade de imitar as novelas, de tomar banho de chuva, de inventar brincadeiras e ter sempre um aconchego gostoso de pai e mãe.

Sim, sim, eu era feliz e não sabia. Ou até sabia, mas não dei o devido valor. Hoje, tudo o que eu queria nesse mundo era voltar no tempo, era ter tudo isso e curtir muito, muito, muito a minha família, sobretudo a minha mãe, que, com todas as suas qualidades e “defeitos”, foi realmente a melhor mãe que eu poderia ter tido e que hoje faz tanta falta. Ah, mamãe, que saudades da senhora :~~(

Fui abençoada com uma família maravilhosa. Um dia, eu tive tudo que qualquer pessoa poderia querer. Tive tudo que realmente importa nesta vida. Hoje, não tenho mais nada. Nada que realmente importe. Nada que realmente me faça feliz. Nada como era antes. Tenho “apenas” uma vida e, até onde sei, saúde. No entanto, não sei muito bem o que fazer com essas coisas. Nem se quero fazer algo.

Tentando voltar no tempo, nem que seja por alguns minutos:


Sorri...





‎"Sorri quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos vazios

Sorri quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador

Sorri quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados doridos

Sorri vai mentindo a sua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz"

Charles Chaplin

Lidando com as perdas

Minhas orações mudaram. Sim, elas mudaram consideravelmente. Até nisso minha vida mudou. A dor da perda de mamãe se abateu sobre mim de uma forma brutal, mudando tudo, inclusive a oração que fiz durante anos, desde que me entendo por gente. A oração mudou sem que fosse atendida completamente. Todos os dias, pedia a mesma coisa, saúde, paz e muitos anos de vida para meus pais, irmãs, familiares, amigos e família dos amigos. Já era algo automático, mas feito com muita fé e esperança. Uma oração de pedidos acompanhada sempre por agradecimentos pela vida.  Sei que Deus não é surdo, mas eu não tinha mais nada para pedir a Ele, a não ser isso, por isso repetia tanto. Bem... as coisas não aconteceram como eu pedi e tanto desejei. Sem que estivesse preparada ou que imaginasse, elas mudaram. Tudo, tudo, tudo.

Hoje, tenho tido um pouco de dificuldade em orar. A fé esmoreceu um pouco, mas não morreu. Não sei mais o que falar, o que pedir, o que exatamente agradecer, embora saiba que tenho muito para agradecer. Não tenho feito bem uma oração, mas uma “emissão de energias”, se é que posso chamar assim, para que todos que estejam enfrentando a mesma dor que eu possam encontrar consolo de algum modo. Tem surgido em mim uma vontade de ajudar a quem também perdeu uma parte de si, uma vontade de dizer para essas pessoas: "ei, você não está só". Mas como ajudá-las? Como?

Agora, já tendo vivenciado essa triste experiência, tenho consciência de que nada, absolutamente nada que possamos falar para as pessoas que estão passando por isso irá amenizar a dor delas. Mas também sei que, em momentos assim, é mais "fácil" desabafar com pessoas que não estão tão envolvidas e machucadas com o fato, com pessoas que estão realmente dispostas a te ouvir e ajudar, mesmo que essa ajuda seja "apenas" esta: a de ouvir com real interesse e dedicação. 

Sei que nessas horas não há muito para dizer, sei que todo mundo quer ajudar e oferecer um ombro amigo, o que é muito louvável. Mas, pelo menos eu, me sinto mais compreendida por quem sabe como essa dor machuca. Fases como "faz parte dos planos de Deus", "Ela cumpriu sua missão aqui na terra", "Chegou a hora dela" ou “Todos nós iremos um dias” parecem não ter sentido, parecem ser apenas uma ladainha repetida à exaustão por quem não tem mais nada a dizer. Parecem palavras vãs, jogadas ao vento. Palavras ditas por quem nunca passou por isso e que não faz ideia da dor, por quem parece ser inatingível pela morte, mas não são. Ninguém é. Mesmo que a gente acredite em algumas dessas palavras, elas perdem qualquer força, afinal, como alguém quem não tem noção do que você está passando pode saber de algo?

Mais tarde, quando as emoções começam a tomar seus lugares no nosso coração, dependendo da fé de cada um, essas palavras fazem ou não sentido. Não é que eu esteja “desprezando” o apoio das pessoas que nunca perderam ninguém. Pelo contrário, sei da importância e do valor desse apoio e peço: fiquem perto de mim! No entanto, não posso negar que quando converso com alguém que já passou por isso, ou quando vejo depoimentos na internet (algo que tenho feito muito), sinto-me mais compreendida. É como se eu pudesse, por um segundo, compreender de verdade o óbvio: que a morte faz parte da vida, que todos perdem, não importa o que façam ou quem sejam. Sinto-me menos sozinha no mundo assim.

Foi pensando nisso, no meu leve “consolo” ao ler relatos de outras pessoas que passaram por isso, conhecer histórias de gente desconhecida, mas que também sofreu pela perda, ver conselhos sobre como continuar a vida etc. que eu pensei em como seria interessante se houvesse um grupo para ajudar pessoas que perderam entes queridos. Vi que algumas cidades do País já têm algo do tipo e aqui, neste blog, achei depoimentos, textos e palavras de apoio, mesmo que não tenham sido direcionadas para mim (copio a página a seguir, mas existem muitas outras postagens “interessantes”): http://espacoangelical.blogspot.com/2009/07/reportagem-que-saiu-na-revista-marie.html

Se não posso ou não tenho maturidade suficiente para fazer algo assim aqui, pelo menos deixo aqui o espaço aberto para quem quiser falar do assunto, para quem quiser contar sua experiência sobre como “superou” a perda de um ente querido, para quem quiser desabafar etc.

Ainda está tudo extremamente difícil pra mim, a saudade é grande e machuca demais, mas, já que tive que passar por essa situação (que, se tivesse escolha, jamais passaria), estou tentando enfrentá-la da “melhor” forma possível, tentando fazer com que ela não seja em vão, que sirva para algo, nem que seja para escutar alguém. É (também) por isso que eu oro hoje.


“Diante da morte, todos os argumentos terminam. Somos limitados demais para encontrar a resposta exata que o nosso coração almeja. Para quem tem fé, a morte deixa de ser um fantasma e se torna a condição indispensável para o encontro do homem com Deus

Mamãe morreu?


Mamãe morreu? Morreu de verdade? Não volta mais? Estas são algumas das perguntas que tenho me feito constantemente nos últimos dias, sobretudo ao acordar, quando me deparo com uma realidade totalmente diferente da que estava acostumada e da que eu imaginava que viveria pelos próximos anos. A essas perguntas, somam-se muitas outras, tais como: E agora, o que será de nós? Por que isso aconteceu, sendo ela tão jovem? Será um castigo de Deus? Um dia essa dor vai passar? Será que um dia irei encontrá-la? Por quê? Por quê? Por quê?

O fato é que, mesmo sabendo que a morte é inerente ao ser humano e que, mais cedo ou mais tarde, todos nós teremos um encontro com ela, seja pela nossa própria morte ou pela morte de alguém muito amado por nós, achamos que este dia está muitooo longe e que, quando ele se aproximar, teremos tempo de corrigir nossos erros, fazermos coisas que queremos ou nos prepararmos melhor para encarar a morte. Eu também pensava assim, mas tive a confirmação de que as coisas não ocorrem desta forma, que a morte vem, muitas vezes, sem dar aviso nenhum, no momento que menos esperamos.

Quando mamãe sentiu um dor em uma noite de segunda-feira, no final de junho, ficamos preocupados, mas achávamos que seria algo "simples", que teríamos tempo para investigar e tratar, sem correrias, para que tudo ficasse bem, sobretudo porque essa dor passou logo. Mas, quando a dor voltou, muito forte, na manhã de sexta-feira da mesma semana, no dia 25 de junho, nossa preocupação cresceu consideravelmente, mas nunca, em nenhum momento, passou pela nossa cabeça que estávamos perdendo mamãe.

Foram quase três dias até descobrirmos o que ela realmente tinha. Diversos exames foram feitos, todos apontando para uma apendicite, mas, somente durante a cirurgia, veio o diagnóstico correto. Diagnóstico tardio, incapaz de reverter a situação da minha amada mãe. Fomos surpreendidos por uma doença que nunca tínhamos ouvido falar, que veio em sua forma mais grave e tirou mamãe de nós. Após a cirurgia, ela ainda ficou dois dias em coma e partiu para a eternidade, no início da tarde de terça-feira, 28 de junho. Foram dois dias de angústia, mas de muitas orações, louvores e súplicas para que ela ficasse boa. Nada adiantou.

Depois disso e de todos os horrores de velar e enterrar a pessoa mais importante da nossas vidas (da minha, das minhas irmãs e do meu pai), restou o choque, a perplexidade, a incredulidade, a falta, a dor, as lembranças, a saudade incomensurável, as lágrimas e um turbilhão de perguntas, de “por quês”, de “e se...”. Pesquisando e conhecendo a gravidade da doença, sabemos que salvá-la seria mesmo um milagre, mas não conseguimos aceitar esta perda tão repentina.

Mamãe nunca ficava doente. Era raro vê-la gripada ou mesmo com dor de cabeça. A única vez que a vi sofrer com dor foi durante uma crise de hérnia de disco, que, após controlada, nunca mais a incomodou. O único problema de mamãe era com o colesterol alto, que ela já estava buscando controlar com o auxílio de remédios.  Além disso, mamãe sempre foi a mais saudável de suas irmãs e eu acreditava que ela viveria muito, ficaria bem velhinha, assim como vovó, mãe de mamãe, que, no dia 04 de julho, completou 94 anos.

Por outro lado, papai sempre nos inspirou mais cuidados, pois é de uma família com um sério histórico de doenças cardíacas, onde, até agora, a idade máxima alcançada por um de seus irmãos foi 70 anos. Os demais morreram com idade entre 63 e 68 anos, e ele completou 60 neste ano, motivo pelo qual sempre brincava com mamãe, dizendo para ela se preparar, pois ele já estava perto de partir. Com todo esse histórico e sofrendo de pressão alta, nunca pensamos em perder mamãe antes dele, não que quiséssemos perdê-lo, pois esta ideia também é MUITO dolorosa. Contudo, fomos surpreendidos, pois nunca pensamos em perder mamãe. Levamos uma rasteira e confirmamos que as coisas não ocorrem do jeito que pensamos, não seguem lógicas.

Passados 16 dias da partida de mamãe, ainda não temos respostas para as perguntas que surgem a todo momento. Mas, a despeito da nossa vontade, tentamos nos convencer de que ela realmente não voltará mais, mas que continuará vivendo em nós. Esse convencimento não é nada fácil. Tento tocar a vida, mergulhar no trabalho, o que tem ajudado, mas me ela não me sai do pensamento. Me pego pensando em combinar coisas com ela ou com pensamentos do tipo: “Quando mamãe chegar, vamos fazer isso” ou “Preciso perguntar isso pra mamãe”. Ainda espero por ela e, quando me dou conta de que ela não voltará mais, entro em desespero.

Penso que jamais entenderemos porque ela foi levada tão cedo, tão jovem, tão cheia de saúde, de vida, de sonhos e de vontade de viver. Se acostumar com a sua ausência tem sido muito difícil, uso a palavra muito por falta de outra que consiga expressar a intensidade da dificuldade que enfrentamos. Durmo e acordo pensando nela, tudo que vejo me lembra ela. Quero ligar, quero conversar, comentar coisas com ela, perguntar sua opinião sobre assuntos diversos do cotidiano, combinar coisas, planejar coisas etc., mas me frustro todas as vezes, a cada minuto que penso nela, porque sei que nada disso será mais possível.

Alguns podem pensar que, por morar distante dela, eu sofra menos, uma vez que o meu dia a dia não era com ela e, por isso, não mudou muita coisa. De fato, eu continuo tendo que trabalhar, as crianças dos vizinhos continuam brincando e gritando no meu prédio, as roseiras que ela plantou, com o auxílio de papai, continuam crescendo na minha varanda e eu continuo tendo que resolver os problemas do cotidiano. Contudo, a vida não é e nunca mais será a mesma. O mundo ficou mais cinza e triste pra mim e para todos que a amavam e amam.

A ligação que possuímos com uma pessoa não está relacionada ao nosso dia a dia, ao nosso cotidiano, à nossa rotina. É algo muito maior que, mesmo brigando, criticando, se desentendendo, não acaba, não passa, não morre. Ela poderia não estar fisicamente no meu dia a dia, mas sempre esteve no meu íntimo, nos meus pensamentos, nas minhas esperas constantes para revê-la, pela sua chegada ou pela minha ida até a sua casa, a minha verdadeira casa.

O que sinto, assim como minhas irmãs e meu pai, é um buraco, um vazio, uma falta que não tem explicação, que nada preenche. Uma saudade angustiante, porque sei que, pelo menos nesta vida, não irei mais abraçá-la, a não ser em sonhos. Somente quem já passou por uma situação assim é capaz de entender o sofrimento, a dor da ausência, da perda.

Tenho saudade do seu jeitinho avoado, de ligar e ouvir ela responder “Oi, amor”, quando eu falava “Oi, mãezinha”, de conversar com ela, de ouvir sua opinião, de trocar ideias, de sonhar juntas etc. Apesar de todo o amor que sempre tivemos uma pela outra, também tivemos desentendimentos, como a maioria das mães e filhas. Essas coisas e o meu jeito de ser com as pessoas, em alguns momentos, inclusive com ela, têm me deixado mais triste ainda, pois acho que não fui a filha que ela merecia ter tido, acho que poderia ter feito muito mais por ela, mimado e amado ela muito mais.

Tenho culpa pelas coisas que não disse, pelas coisas que não fiz, pelas coisas que pensei em dizer e fazer, mas que não executei. Sinto culpa e remorso porque ela realmente merecia muito mais de mim, mas eu achei que nós duas tivéssemos mais tempo e que eu estava fazendo o suficiente, mas não estava. Tento me consolar pensando que eu sou humana, que eu tenho falhas, sou cheia de defeitos, mas, nada do que eu tenha feito, dito ou deixado de fazer ou dizer modificou meu amor por ela ou o dela por mim. Me consolo lembrando dos nossos bons momentos e de que sempre procurei dizer e repetir para ela que eu a amava muito.

Apesar das minhas falhas, imperfeições e erros, sei que ela, tinha orgulho de mim e das minhas irmãs, que nos amava incondicionalmente. Ela tinha aquele orgulho de mãe, muitas vezes exagerado, que deixa a gente envergonhada, mas que, no fundo, a gente adora.

Não posso mais sentir mamãe fisicamente, sei que ela continua viva, pois o que ela nos ensinou e deixou conosco é forte demais para morrer com o seu corpo. Mamãe nos ensinou muito em vida, mesmo quando achávamos que não, e também em morte. Tento acalmar meu coração pensando que a morte não é o fim, mas não é fácil.

Ainda vai demorar MUITO até eu digerir tudo isso, aceitar a morte dela, aprender a lidar com isso de forma saudável, sem fingir que nada aconteceu ou sem empurrar a dor para debaixo do tapete. Hoje, alterno momentos de alegria e gratidão por ter vivido 26 anos com ela, por ter tido ela como mãe, com momentos de extrema tristeza e desilusão com a vida.

Quando digo para as pessoas “Só Deus para nos consolar” ou quando escuto isso delas, sei que só Ele mesmo, pois somente uma força sobrenatural, muito além do nosso entendimento, é capaz de mostrar uma luz, de dar conformação e consolo a um coração despedaçado e sem esperanças. Estou buscando forças em Deus para me ajudar e ajudar a minha família.

Aos amigos que foram ao velório e ao enterro, aos que ligaram, mandaram mensagens, e-mails etc., agradeço sinceramente a consideração, o carinho e a atenção. Peço desculpas se estou isolada, se não quero conversar, mas estou sentindo necessidade de ficar só. Escrever aqui já me ajudou muito. E, aos que perguntam se preciso de algo, eu quero responder que sim, que preciso MUITO de mamãe, MUITO MESMO. Mas, como não posso tê-la, aviso que preciso também de orações, para mim e para minha família. Peço que orem, com real interesse, para que mamãe, papai, minhas irmãs, eu e todos os parentes e amigos que amam mamãe fiquem bem, cada um na sua nova realidade. Precisamos disso.

Vale a pena ler de novo

  • A lição final
  • A sangue frio
  • Crônicas de Nárnia
  • George e o segredo do Universo
  • O caçador de pipas
  • O Pequeno Príncipe

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